SER DIFERENTE

Há uns anos atrás, trabalhei na Associção de Cegos e Ambliopes de Portugal, numa das suas Delegações. Nesta associação, apoiam-se crianças, jovens e adultos com deficiência Visual.

Hoje lembrei-me de um jovem de 13 anos; cego congénito; vivia numa aldeia nos arredores da cidade onde estava sediadas a Delegação. Era um jovem que vivia com a mãe; o pai tinha emigrado e só vinha passar férias no verão; tinha um irmão mais velho que já trabalhava.

Este jovem deslocava-se á Delegação desta Associação uma vez por semana. Tinha apoio no Braille, em Terapia Ocupacional e Orientação e MObilidade. Assisiti a algumas sessões de terapia ocupacional e fiquei impressionada! Não pela incapacidade que este jovem pudesse ter mas pela falta de estimulção que lhe era dada. Chegou-se á conclusão que pelo facto de ser cego congénito, a mãe lhe fazia tudo. Mas mesmo tudo! Então este jovem, com treze anos, não sabia comer pela mão dele, não sabia partir alimentos, não sabia beber água pela sua mão, não se vestia e despia sózinho, não apertava camisas ne desapertava, não ia á casa de banho sózinho. Durante largos meses, a terapeuta ocupacional teve que praticar com ele actividades da vida diária para que ele se pudesse tornar o mais possível autónomo. 

Várias vezes a psicóloga da associação tentou falar com a mãe do jovem para que em casa lhe permitisse ser mais autónomo mas esta arranjava sempre outras coisas para fazer.

Nesta história, nunca esqueci um pormenor: na casa deste jovem havia galinhas e ele sabia que as galinhas tinham penas; mas como os alimentos lhe eram apresentados no prato e ele não tinha outras vivências, o jovem comia peixe e achava que o peixe também tinha penas (e não escamas) e não sabia que tinha espinhas (a mãe tirava). Outro pormenor: todas as frutas lhe eram apresentadas descascadas; pelo que não sabia que a laranja tinha casca.

Esta foi uma história que me marcou!

 

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